Por Floriano Pesaro
As políticas sociais no Brasil têm sua trajetória marcada por um círculo virtuoso de transformações e reformas, decisivas na consolidação de uma nova lógica de combate às desigualdades de oportunidades entre os cidadãos. A Constituição de 1988 e a aprovação da Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS), em 1993, são marcos deste processo de democratização, ampliação e universalização dos direitos, que imprimiu na agenda da política pública a responsabilidade pela proteção social sem contribuição prévia, ampliando o conceito de Assistência Social o alocando no tripé da Seguridade Social, junto com a Saúde e a Previdência.
Um olhar atento ao mais recente Relatório de Desenvolvimento Humano da ONU demonstra, no entanto, que estamos retrocedendo. Apesar da transformação brasileira iniciada em 1994, “quando o governo implementou reformas macroeconômicas para controlar a hiperinflação, com o Plano Real, (…) a média anual de crescimento do IDH do Brasil foi de 1,26%”, colocando-nos na condição de um dos países com expansão mais alta no período. Já entre 2000 e 2012, a média de crescimento do IDH brasileiro decaiu para 0,73% ao ano – nos afastando dos países que conseguem imprimir e manter um ritmo elevado de desenvolvimento.
Iniciado em 2000, com a criação do Fundo de Combate á Probreza, os programas condicionados de transferência de renda (PTCs) começaram a nascer. Eram ações como o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, Bolsa Alimentação, Auxílio Gás e o, pioneiro, Bolsa Escila Federal.
Este último inspirado no Programa de Garantia de Renda Familiar Mínima, da Prefeitura Municipal de Campinas (criado em 1994 por Magalhães Teixeira, apelidado de Gama), e no Programa Bolsa Familiar para a Educação, do Distrito Federal (criado em 1995 por Cristovam Buarque), o Bolsa-Escola Federal representou uma importante inovação na política pública brasileira. A novidade, na época, foi justamente estabelecer a vinculação estreita da renda mínima com a política educacional, o que acabou por colocar e manter 10,7 milhões de crianças de 6 a 15 anos nos bancos escolares nos 5.561 municípios brasileiros à época.
Numa transição democrática sem precedente no País, os programas condicionados de transferência de renda foram entregues á nova gestão, que já em 2003, os agrupou e rebatizou de Bolsa- Família (o Peti é incorporado a ele em 2006).
A partir de então, os PTRs enfraqueceram a vinculação entre benefício e contrapartida. É exatamente na contrapartida (a presença na escola, a carteira de vacinação em dia, o peso adequado da criança, etc) que reside o segredo para os avanços sociais de longo prazo. O dinheiro resolve a urgência imediata e a contrapartida garante que esta família tenha as condições mínimas para ascender socialmente, rompendo, de uma vez por todas, com um ciclo histórico de miséria. Fato é que o elo (renda-contrapartida) foi enfraquecido e não houve mais avanços no enfrentamento á pobreza.
Neste momento de estagnação é premente que voltemos nossos olhares para o básico: o arcabouço legal já estabelecido. Colocar novamente a educação em foco e voltar a nossa atenção a LOAS, mais especificamente a seu primeiro artigo:
Art. 1º A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas.
Parece incrível que o país não tenha evoluído na questão e passado a debater e definir quais são os tais mínimos sociais. E mais: não há qualquer prática social que garanta um conjunto integrado de ações que possam ser capazes de ir a diante e estabelecer quais são os próximos passos da inclusão, mantendo a transferência de renda e indo além.
Pouco se pode esperar de uma política social que esteja somente centrada na questão monetária, importante, mas longe de ser o sufiente. Estamos estagnados e a política pública para desenvolvimento e inclusão social precisa seguir a diante sob pena de retrocedermos a passos largos, como já sinaliza o PNUD.
Definir os mínimos sociais é uma urgência. Questões elementares estão em aberto: garantia de certidão de nascimento e demais documentos básicos; moradia segura, escolaridade mínima para os adultos, criança na escola e aprendendo, acesso seguro á saúde, acesso a transporte público de qualidade e baixo custo. Sem dúvida, após a estruturação desta reflexão iremos reorganizar e avançar no modelo das políticas sociais no Brasil.
Floriano Pesaro, sociólogo, vereador e Líder da bancada do PSDB na Câmara Municipal de São Paulo